Geração 1980 – Os Percalços do Cinema Paranaense no Governo Collor

por Isadora Raquel Rupp

O cineasta francês Jean-Luc Godard, criador de um dos movimentos mais importantes do cinema, a Nouvelle Vague, já dizia que as grandes manifestações cinematográficas começam formadas por um grupo de cinéfilos. E foi justamente assim que o cinema paranaense cresceu, mais especificamente, a geração tratada neste artigo. Garotos que, ao invés de reunirem-se para jogar bola, preferiam fazer filmes no início da década de 1980. Atitude, em tese descompromissada, que possibilitou uma nova cara à cinematografia paranaense.

Esses realizadores, assim que começaram a se consolidar, sofreram o impacto das políticas do governo Fernando Collor de Mello, como a falta de verbas e de espaço para divulgação de filmes feitos sem dinheiro e com muita boa vontade. A crise, ocasionada, entre outros fatores, pelo fechamento da Empresa Brasileira de Filmes – Embrafilme, maior distribuidora e divulgadora do cinema nacional, conseguiu desmantelar o cinema brasileiro e paranaense. Apesar de antiga e com nomes como Sylvio Back, até aquele momento o cinema paranaense nunca havia tido tantos novos profissionais e ideias. Formados pela Cinemateca de Curitiba, fundada em 1975, o local foi o polo gerador do cinema no estado. Idealizada pelo escritor Valêncio Xavier (que morreu no dia 5 de dezembro de 2008), juntamente com Francisco Alves dos Santos – o Chico –, ela é a terceira no Brasil.

Desde o início, além da difusão de filmes, a cinemateca preocupou-se com a formação de novos profissionais, oferecendo cursos livres teórico-práticos gratuitos. Foi dessas primeiras turmas que surgiu o pessoal da Geração 1980, que encontrou, finalmente, um espaço para o debate. “A Cinemateca sedimentou a nossa paixão pelo cinema, que começamos a ver como uma possibilidade de expressão. Pra mim, foi um laboratório mágico”, diz o cineasta Beto Carminatti, que iniciou sua carreira no começo da década de 1980 e gravou seu primeiro filme, Delirium Dreams, com a técnica Super 8.

Além dos cursos, a Cinemateca oferecia a possibilidade de montar e divulgar filmes. “Naquele momento, em 79, 80, você só teria possibilidade de ter um curso fora do Paraná. Então, o nosso ponto de encontro era efetivamente lá. As exibições, as mostras e o pouco equipamento que tinha ali, uma moviolazinha Steinbeck 16mm, uma câmera bem ruim, que usava filme reversível… era muito precário, mas para a gente era tudo”, diz a cineasta Berenice Mendes, formada pela primeira turma.

Com todas as manifestações cinematográficas promovidas naquela década de 1980 no melhor estilo “Cinemateca Francesa”, as ideias e produções estavam efervescendo. Porém, o fechamento da Embrafilme logo no início do governo Collor, em 1990, acabou prejudicando os mecanismos que a instituição oferecia. Pois, além de distribuidora, a estatal teve um papel de escola para muitos cineastas brasileiros. Ela tornou possível a formação e especialização de muitos técnicos e de mão-de-obra para a atividade cinematográfica.

Um dos primeiros impactos para a Cinemateca de Curitiba foi a interrupção da chegada de filmes. “A Embrafilme nos fornecia filmes sem nenhuma burocracia, tínhamos um convênio bom. E também nos deu know-how de equipamento”, explica o ex-diretor da Cinemateca, Chico Alves. As monografias produzidas pelos estagiários sobre cineastas e movimentos cinematográficos no Paraná eram resultado de convênios com a estatal. “Então, se não fosse esse estímulo e esse apoio nós não teríamos avançado como avançamos”.

Os acordos com embaixadas para exibição de filmes estrangeiros também foram interrompidos, já que a Embrafilme ajudava nesse trâmite para conseguir o material. Com profissionais qualificados sem ter onde trabalhar e com poucos filmes nacionais lançados no período, a Cinemateca não tinha mais películas brasileiras para exibir. “Conseqüência? O cinema estrangeiro tomou conta, dominou ainda mais”, frisa Chico.

Os cineclubes criados acabaram minguando, pois a Embrafilme vinha estruturando, durante o tempo que existiu, uma distribuidora exclusiva para atender cineclubes. “Era uma experiência riquíssima. Afinal de contas, criar uma estrutura para os jovens discutirem filmes é muito importante. E isso se foi com o Collor e com a Embrafilme. Trágico em todos os sentidos”, lamenta o ex-diretor.

Logo que assumiu a presidência, Collor pregou para o Brasil e, consequentemente, também para o cinema, políticas totalmente neoliberais. Rebaixou o Ministério da Cultura para Secretaria (o que significa, automaticamente, um número menor de verbas destinada para a área) e extinguiu a lei nº 6.281/75, conhecida como Lei do Curta (que determinava a exibição obrigatória de um curta-metragem nacional antes de um filme estrangeiro). “A exibição era compulsória. Foi um programa interessante, mantido por uns 10 anos aos trancos e barrancos. Hoje, não poderíamos forçar o exibidor. Foi uma saída desesperada, mas necessária”, salienta Frederico Fullgraf, presidente, na época, da Associação Brasileira de Documentaristas – ABD.

"Vamos Junto Comer Defunto"

No pacote de desmantelamento, como já citado, veio o fim da Embrafilme, criada em 1969. Em sua melhor fase, ocupou aproximadamente 35% do mercado cinematográfico brasileiro e alcançou uma média de 50 milhões de espectadores para filmes nacionais. Por meio dela, conseguia-se apoio financeiro para produções, ajuda para montagem, divulgação via escritórios (cada capital tinha uma sede) e auxílio para distribuição. Elói Pires Ferreira, cineasta curitibano que dirigiu seu primeiro filme em 1988, Vamos Junto Comer Defunto, e que é um dos expoentes da Geração 1980 no Paraná, afirma que o mecanismo de fomento da empresa era interessante, já que havia contrapartida por parte do cineasta. “Ela tentava proporcionar uma certa autossustentação. Financiava o filme, distribuía e ficava com uma parte do recurso. Esse dinheiro era recolocado na produção de outros. Não era só o Estado paternalizando. Pelo contrário, havia uma compensação”.

A infraestrutura para o cinema brasileiro e artes em geral ficou totalmente prejudicada naquele momento. Sem leis e com problemas estruturais, faltou trabalho para muita gente. A cineasta Berenice Mendes acredita que Collor causou um prejuízo imenso para os brasileiros ao tratar a cultura de forma “tão irresponsável”. “O que ele fez foi desmantelar todo o aparato e estrutura de produção, deixando à míngua não só produtores independentes e artistas, mas acima de tudo jogando fora, na lata do lixo, agentes de cultura que trabalharam a vida inteira naquilo”.

Um exemplo eram os chamados produtores-delegados, formados para acompanhar a produção dos filmes financiados pela Embrafilme. O profissional precisava entender das técnicas, custos e orçamento de uma produção. “Gente que tinha toda aquela experiência da atividade, de repente, ficou sem ter o que fazer! Uma boa parte foi mandada embora e outra permaneceu sem função, vagando no Estado”, relembra a cineasta.

O cineasta Marcos Jorge, diretor de filmes como o premiado Estômago (lançado em 2007), resolveu partir para uma espécie de “exílio” na Itália por conta da desorganização cultural. Em 1991, dirigiu Criação, uma co-produção entre Brasil e Itália, mas utilizou exclusivamente dinheiro do próprio bolso. “A ação do governo Collor em relação ao cinema foi um dos motivos que me levaram a sair do Brasil. O cinema simplesmente acabou, e eu fui atrás de uma formação e de uma experiência que no país já não estavam disponíveis”.

Anteriormente ao governo Collor, a Embrafilme já vinha definhando na década de 1980, prejudicada pela economia instável do Brasil. Na “década perdida”, a inflação podia chegar a até 90% ao mês e a moeda se desvalorizava, o que atingia o cinema, atividade diretamente atrelada ao valor do dólar. Os preços de produtos como películas e equipamentos dispararam, e projetos em andamento incentivados pelo governo minguaram. “Se um processo ficasse três meses parado virava um nada. Foi assim por boa parte da década de 1980 e 1990”, relembra o cineasta Fernando Severo, um dos pioneiros na técnica Super 8 no Paraná (utilizada principalmente na década de 1970).

O desgaste ideológico foi outro problema enfrentado pela Embrafilme. Havia uma série de denúncias de produtores que afirmavam existir um “apadrinhamento” dentro da estatal, ou seja, de que os favorecidos seriam sempre os mesmos cineastas. “Consta que o Collor liquidou a Embrafilme.Ela já vinha sendo liquidada. E aí fecharam aquela porcaria, que já tinha degenerado em um balcão de atendimento entre amigos”, opina Frederico Fullgraf. “Quem ganhava dinheiro eram os cineastas cariocas e paulistas, que financiaram seus apartamentos, compraram seus carros, chácaras. Isso foi a Embrafilme durante 20 anos, foi realmente um bordel. Não podia realmente funcionar mais, não dessa maneira”.

Criticada ou não, o fato é que os cineastas viram ruir o único recurso com que, em tese, poderiam contar. A desesperança tomou conta da classe cinematográfica e ninguém sabia ao certo qual direção tomar. Trabalhar com vídeos institucionais foi a saída para cineastas como Werner Schumann. “Os profissionais foram sobreviver em outros rumos. Era uma frustração grande. De repente, nos vimos em um país sem cinema”. Em 1990 ele realizou de forma independente o curta-metragem Volk!, que teve como principais protagonistas galinhas. “Volk, em alemão, significa povo. Quis fazer uma analogia entre esse sistema das granjas e o nazismo. Na verdade, como não tinha muito dinheiro, resolvi fazer com as aves. Ficou bem mais fácil, fomos em uma granja e filmamos”.

A Embrafilme também era julgada por carregar nas costas um enorme peso político: o fato de ter sido criada na ditadura militar. Com o fim do regime, veio o questionamento: a instituição estaria guardando os ranços do período e prejudicando a democracia? Esse foi o argumento do então secretário de cultura do governo Collor, Ipojuca Pontes, para fechar a empresa. Elói Pires Ferreira discorda: “Apesar de estar sob a égide da ditadura, os beneficiados pela empresa tinham liberdade criativa. Existia censura, obviamente, mas era em outros moldes. Acho uma bobagem criticar porque foi feita no regime militar. Saíram obras importantes nesse período que mantiveram a nossa fisionomia cinematográfica. Não teríamos cara nenhuma se não fosse isso”.

Por conta do fechamento da estatal, muitas produções paranaenses estão inacabadas até hoje. É o caso de um projeto de Geraldo Pioli e Paulo Friebe. “Tínhamos rodado um filme em 16mm com recursos próprios no começo de 1990, Entrega da Imortalidade. Economizamos e compramos duas latas com película 16 mm. E só. Não tinha dinheiro pra mais nada”, conta Pioli. O material disponível possibilitava apenas 24 minutos de gravação. Eles conseguiram revelar os negativos, porém havia a necessidade de finalizar o projeto. A ideia era conseguir algum financiamento via concursos da Embrafilme naquele começo de 1990. “Aí veio aquele balde de água fria do ‘desgoverno’ Collor pelas mãos de Ipojuca Pontes”. Eles nunca mais conseguiram terminar a produção. “Todo mundo brochou naquele momento. O filme está inacabado até hoje. Eu e o ‘Gordo’ sempre falávamos em retomar, mas o puto resolveu morrer…”, lamenta Pioli. Paulo Friebe faleceu em 12 de maio de 2004, aos 44 anos, vítima de um derrame cerebral.

Outro filme diretamente prejudicado foi O Drama da Fazenda Fortaleza, com direção da cineasta Berenice Mendes. O projeto iniciou em 1988 mas o roteiro já tinha sido escrito em 1980, com a ajuda do escritor Valêncio Xavier e do cineasta Peter Lorenzo, baseado no romance homônimo de David Carneiro, escrito em 1943. Finalizado, o projeto participou de um concurso da Embrafilme. “Ela ia premiar e produzir 20 longas-metragens. Se inscreveram 500 pessoas do país inteiro. Foi uma grande alegria porque, além de poder contar a história, eu era uma realizadora de fora do eixo Rio/São Paulo, num estado sem tradição de cinema e sem ser filha de diplomatas ou banqueiros, que até hoje é quem consegue efetivamente produzir no Brasil”, enfatiza Berenice.

Como a cineasta era iniciante, o seu roteiro seria um dos últimos a ser atendido. Ao longo da década, ela esquematizou o elenco, realizou trabalhos de pesquisa nas locações e de fotografia. As gravações começariam em setembro de 1989, porém, uma tragédia pessoal impossibilitou os planos. Seu então marido, o poeta Paulo Leminski, faleceu no dia 7 de julho. A cineasta procurou a Embrafilme para adiar a produção em alguns meses e ficou combinado do filme ser rodado a partir do dia 10 de março de 1990. “No dia 7 de março o Collor acabou com a Embrafilme”. Berenice nunca mais conseguiu retomar o seu projeto, já que a União não honrou o compromisso. A cineasta tentou conversar com o governo do Paraná, mas não teve sucesso. “Ouvi pessoas dizerem que era muito dinheiro para eu lidar sozinha, que se não existia mais suporte federal, aqui é que não iam colocar dinheiro nenhum em cinema. Eu senti que, por mais que viesse a Lei Rouanet depois, a gente ia levar pelo menos 10 anos para reestruturar os mecanismos de produção de audiovisual no Brasil”.

A cineasta tem razão. O primeiro longa-metragem lançado no país após esse período foi Carlota Joaquina, de Carla Camurati, em 1995. Quando a instabilidade política do governo Collor ficou insustentável, houve uma grande reforma ministerial. Como ele estava “queimado” no meio artístico, resolveu substituir Ipojuca Pontes. Em seu lugar, colocou o embaixador Sérgio Paulo Rouanet, criador da Lei nº 8.313/91, a conhecida Lei Rouanet.

Na realidade, o novo Secretário restabeleceu os princípios da Lei Sarney (nº 7.505), regulamentada em 1986, que concedia o direito de benefícios fiscais em imposto de renda para empresas que patrocinassem algum tipo de manifestação cultural. Essa lei foi proposta quando Sarney ainda era senador em Alagoas, em 1972, mas foi sancionada apenas 14 anos depois.

Outros cineastas paranaenses haviam iniciado seus filmes no final da década de 1980. Gravado em 1988, Vamos Junto Comer Defunto conta a história de um grupo de crianças que tem fascinação em assistir enterros e funerais. “Me inspirei na história de um amigo de infância que morava perto da minha casa. Ele participa também, faz um bêbado que abre e fecha o filme”, explica o diretor Elói Pires Ferreira.

A produção foi pesada: várias locações, elenco e cenas tecnicamente complicadas de gravar. Além disso, o tema não era dos mais politicamente corretos. “Foi um trabalho muito bom. Nós filmamos dentro da Igreja, as crianças espiando o defunto, o primeiro trabalho do Elói com película. Aliás, os padres não gostaram muito desse título, xingaram o Elói”, conta o fotógrafo do filme, Euclides Fantin.

Empolgado com o roteiro e com a produção que se encaminhava (o filme foi rodado em três dias e meio), Elói gastou muito mais do que deveria, incluindo suas economias para comprar um apartamento, na época, aproximadamente 20 mil dólares. “Dava para comprar um apartamentozinho bacana. E eu torrei o dinheiro todo”, conta. Com o filme rodado, ele precisava partir para a finalização, que consiste na revelação da película, montagem e edição das imagens. Utilizou uma moviola do Museu da Imagem e do Som de Curitiba e esperou a verba que havia ganhado, que veio apenas em 1990, um pouco antes de a estatal fechar. “Peguei justamente a pior fase da Embrafilme, a reta final. Com a inflação galopante, o recurso chegou todo defasado. Bancou alguma coisa de laboratório, mas não era suficiente para eu complementar”.

Apesar de todos os contratempos, Vamos Junto Comer Defunto foi selecionado para o Festival de Gramado na categoria curta-metragem. “Torrei minhas economias no filme e nunca mais vi a cor do dinheiro, obviamente. Não deu resultado financeiro nenhum. Mas foi bacana. Passei por uma experiência fantástica, uma verdadeira escola de cinema”, diz Elói.

Outros dois filmes dessa época passaram perrengue para chegar à finalização: Loira Fantasma, de Fernanda Morini, que conta a história de uma famosa lenda curitibana dos anos 1970 – uma loira que pegava um táxi de madrugada e desaparecia – e Lápis de Cor e Salteado, documentário sobre o músico e compositor Palminor Rodrigues Ferreira, dirigido por Nivaldo Lopes.

Como o filme de Fernanda utilizava locações externas e um elenco maior, a diretora foi atrás de diversas empresas e conquistou apoio no que diz respeito a mão-de-obra, estadia em hotéis, restaurantes que forneceram refeições para a equipe e equipamentos emprestados. “É muito mais fácil conseguir coisas para usar na produção do que verba”, compara. Rodaram o filme em 1989 e, quando o dinheiro seria liberado, a estatal fechou. “Foi uma complicação. Os filmes estavam feitos e não tinha nenhuma perspectiva de terminar. Ficaram uns dois anos parados”, conta a cineasta.

Já Nivaldo Lopes, conhecido como “Palito”, escreveu, em 1988, um roteiro sobre o músico e compositor Palminor Rodrigues Ferreira, conhecido como “Lápis”. No ano seguinte, completar-se-iam dez anos de falecimento do artista. “Ele é uma expressão paranaense na música. Fiquei com vontade de fazer um filme que contasse um pouco de sua vida”, explica “Palito”. O problema era, como sempre, conseguir dinheiro para gravar. Então, surgiu o prêmio da Secretaria da Cultura com a Embrafilme, o mesmo que contemplou Elói Pires Ferreira e Fernanda Morini. Palito inscreveu o roteiro e foi um dos ganhadores. No seu caso, o dinheiro veio pela então chamada lei de reserva de mercado, a Lei do Curta.

Lançado em 1990, no Rio Cine Festival, o documentário foi bem recebido pelo público e pela crítica. A finalização teve de ser realizada com recursos não-estatais, já que ele recebeu a verba depois de três anos. “Mesmo antes do fechamento da Embrafilme, o dinheiro já demorava muito pra sair e vinha valendo metade do que na verdade tínhamos ganhado”.

Obviamente, o saldo para o cinema paranaense de 1989 até 1992 não foi nada favorável. Um dos primeiros longas-metragens nunca mais foi retomado e os curtas-metragens lançados eram oriundos do final da década de 1980. Além disso, as políticas estaduais e municipais de incentivo à cultura estavam apenas engatinhando. “Existe uma má vontade em relação à cultura, porque cultura não dá voto. Então, eles dificultam mais do que necessário”, opina Fernando Severo, que em 1991 lançou Desertos Dias, dois anos após a filmagem, justamente por conta dessa lentidão no trâmite de recebimento de verbas.

Benefícios

Sem políticas federais, a classe percebeu a importância de cobrar os governos estaduais e locais para que tomassem para si a responsabilidade de ajudar a disseminar a cultura paranaense. Dentro desse contexto, no começo da década de 1990, duas importantes ações foram responsáveis pela retomada das produções: a criação da Lei Municipal de Incentivo à Cultura e a fundação da Associação de Vídeo e Cinema do Paraná, a AVEC.

Escrita em 1991 e promulgada em 1993 pelo então vereador Ângelo Vanhoni, a Lei Municipal de Incentivo à Cultura baseia-se na renúncia fiscal da Prefeitura de Curitiba em até 2% de arrecadação do Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU) e do Imposto Sobre Serviços (ISS). Além de contribuir para a produção de filmes, a lei auxiliou pessoas que tinham vontade de trabalhar com o segmento. “Possibilitou o aprendizado e o treinamento de um monte de pessoas. A lei foi e é fundamental na construção da cinematografia paranaense”, ressalta o cineasta Geraldo Pioli.

Fundada em 1992, a Associação de Vídeo e Cinema do Paraná (AVEC) teve como objetivo reunir desde os cineastas mais antigos, que inauguraram a ABD Paraná no início de 1980, até novo produtores. “Ela conseguiu fazer com que várias panelas finalmente se encontrassem sobre o mesmo fogão”, aponta Paulo Munhoz, um dos cineastas que encabeçaram a criação do órgão, provocado a “fazer alguma coisa” pelo colunista e crítico de cinema Aramis Millarch, um dos maiores especialistas na área de cultura, que mantinha uma coluna no jornal O Estado do Paraná.

Em 2004, a Secretaria de Estado da Cultura instituiu o Prêmio Estadual de Cinema e Vídeo pela Lei nº 14.279, que estabelece o valor de um milhão de reais para um projeto de longa-metragem e de três telefilmes. “O fato de o governo ter instituído é histórico e honroso. O Estado deve ser o grande sócio propulsor de cinema junto com a iniciativa privada”, diz Frederico Fullgraf.

No entanto, a dependência quase que total dos governos acaba sendo uma faca de dois gumes para o cinema nacional, que fica refém dos temas impostos pelos editais e é suscetível, pois depende única e exclusivamente do político e de sua boa vontade. “Se o cinema brasileiro fosse independente ou se o Estado contribuísse com a feitura de filmes experimentais, talvez podia vir o Collor que fosse que a gente continuaria a fazer cinema no Brasil”, considera Geraldo Pioli.

Enquanto o cinema continua lutando para se consolidar após períodos críticos, o que vale, principalmente para esses cineastas do Paraná, é a paixão em se fazer filmes. “Com Estado ou sem Estado, o meu estado de espírito para fazer os meus trabalhos vai continuar. E creio que muita gente pensa da mesma forma. É muito difícil você ficar esperando que, do ponto de vista oficial, tudo aconteça com rapidez”, acredita Beto Carminatti.


Isadora Raquel Rupp é jornalista formada pela Universidade Positivo e pós-graduanda em Comunicação e Cultura pela Universidade Tecnológica Federal do Paraná. Integra a equipe da revista de cinema Juliette e é autora do livro Amor na Era Collor. O Cinema Paranaense da Geração 1980, ainda sem publicação oficial e do qual foi retirado o texto deste artigo.

2 Comentários

  1. Antonjo Marca Junior disse:

    Gostaria de saber onde consigo ver este filme.

    Att

  2. У нас ситуация совсем другая. Буяна
    как ветром сдуло.

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